Autor: Alcides Mafra Page 6 of 7

Uniclãs

Não faz muito tempo, a Uniclãs, creio que o projeto mais duradouro e bem-sucedido de Porto Belo, resolveu se reunir e, quem sabe, reviver seus bons momentos. Banda, entretanto, voltou a sair de cena após alguns shows, vítima dessa instabilidade tão típica do meio musical. Não houve tempo para mais um registro em CD com a formação original, uma pena.

Entre os êxitos que a Uniclãs conquistou, está o memorável show que a banda fez em Florianópolis dia 4 de abril de 2004, com a participação do vocalista da Titãs, Paulo Miklos. Lembro já ter falado sobre isso aqui no blogue. Gostaria, no entanto, de compartilhar um texto que guardei aqui na minha gaveta virtual. Trata-se de uma resenha que fiz daquele show, para uma disciplina do curso de jornalismo. De marcante daquele show, e que não está no texto, foi o momento em que o Ronaldo (Rona), já falecido, subiu ao palco para abraçar e cantar junto com o titã. Segue o texto:

Uniclãs versão 2018: banda voltou a se reunir para celebrar os 15 anos do disco de estreia (foto: Camila Bernardi Hegele )

Fazia algum tempo que eu não via uma apresentação ao vivo da banda Uniclãs, de Porto Belo. Confesso, de antemão, que a minha maior motivação ao ir vê-los na noite de domingo, 4 de abril, no teatro do Centro Integrado de Cultura (CIC), em Florianópolis, foi a prometida participação do vocalista do Titãs, Paulo Miklos. Devo dizer, aliás, que a presença do “titã” no show foi para lá de especial. No entanto, o que me impressionou mesmo, foi a qualidade da apresentação da banda “da casa”.

Tenho que ressaltar, ainda, que não conhecia o CIC e que fiquei logo encantado com o local. Serviu de moldura perfeita ao show, que começou pontualmente às 21h30. Pena que o público da ilha, por uma compreensiva ignorância em relação à banda, não compareceu. A ausência, no entanto, foi compensada pela presença maciça dos fãs de Porto Belo e Bombinhas, que lotaram três ônibus fretados especialmente para garantir o quorum que a noite pedia.

Voltemos ao espetáculo. A banda, que lançou há um ano seu primeiro CD, “Viagens no Exílio”, debulhou com competência seu set list, como de costume iniciando a festa com a música-título do disco. De cara, foi possível perceber a evolução musical do sexteto, particularmente o baixista Cezinha, que sempre pareceu meio pregado no chão e, nessa noite, desfilou suas linhas de baixo com bastante segurança, sinal de que o pessoal anda se esmerando nos ensaios.

O carisma do vocalista Nando surpreende. As menininhas se espremem num canto junto ao palco e forçam um chilique, mas ele não tem nada de star e vai mandando bem, naquele vocal meio Zé Ramalho, as letras cheias de mistérios e predições que caracterizam o repertório da Uniclãs. Aproveito para me apropriar da definição que fez certo colunista do AN, que classificou o som da banda como sendo “rock messiânico”. Bastante original e, quem sabe, uma futura tendência musical no país.

A banda tem suas próprias influências e lançou mão de vários covers, por sinal muito bem escolhidos. Além do tradicional “Heavy metal do Senhor” – o meu favorito – e “Hey Joe” (letra do Rappa), a banda incorporou “Brasil”, do Cazuza e transformou o palco numa tremenda batucada, com o baterista Guto e o percussionista Carlinhos ditando o ritmo da bagunça. A platéia adorou. Houve espaço para Luiz Gonzaga (“Asa branca”), cantando em conjunto com a joinvillense Aninha da Silva, ela também uma desconhecida de talento em busca do seu espaço.

Depois de esgotar todo o set, Coveiro (violão) anunciou a atração esperada. Interessante que, na TV, o Paulo Miklos parece bem maior. Quem entrou no palco foi um baixinho, saudado pela banda aos acordes de “Sonífera ilha” (em homenagem a Floripa, cortejou Miklos, e o CIC quase foi abaixo). Veio “Bichos escrotos” e o vocal dos Titãs estava bastante à vontade com sua banda de apoio. Vi que ficou impressionado com os riffs ligeiros de Alex (guitarra). E com razão: Alex um dos melhores guitarristas que já vi.

E a festa seguiu assim, Uniclãs e Paulo Miklos tocando músicas do Titãs, eles se divertindo ali e o público se deliciando com aquele encontro que ninguém jamais imaginou ver. O convidado saiu ovacionado e a rapaziada continuou no pique. Miklos ainda voltou para um bis, empunhando uma flauta doce. Uma pena que a banda encerrou o show sem tocar “Ô, cabloco”, uma das suas melhores composições. Mesmo assim, foi um show impecável. Em agosto, a banda segue para São Paulo em busca de espaço para a sua música. Que tenham sorte por lá, pois talento não lhes falta.

Como fazer um jornal chapa-branca – II parte

O amigo Aristides lembrou, nos comentários, de um adjetivo muito usado nos círculos “administrativos” naqueles tempos do Pirão, não sei se popular ainda hoje: cola-branca. Também não sei se exclusivo daqui ou se usado em outros lugares – imagino que sim.

Cola-branca servia para designar o sujeito que não gozava de muito prestígio entre os mandatários do município. Por exemplo, se alguém fosse até a prefeitura para reivindicar algo, porém não fosse do partido assentado no poder, assim que saísse de lá teria seu pedido desconsiderado da seguinte maneira: “Esse é cola-branca!”. Ou seja, poderia esperar sentado pela solução.

Assim, cola-branca era o cidadão da oposição, o “do contra”. Como, durante sucessivas administrações, Porto Belo esteve sob comando do mesmo grupo político, filiado a siglas como PDS e PFL (hoje PP e DEM, respectivamente), a oposição, representada pelo PMDB, incorporou por muito tempo o papel de cola-branca.

Quando o PMDB finalmente assumiu o poder, em 1993, passou a pecha aos adversários.

Mais adiante, criamos no Pirão, em nossa seção de charges, uma tirinha cujo personagem era o Cola-branca. Tentamos brincar com o absurdo e a conveniência que era para os administradores se livrar de questões importantes apenas atribuindo o rótulo de cola-branca a quem exigisse seus direitos. Mas não creio que tenhamos conseguido transmitir a mensagem que desejávamos.

A questão é que, assim que saiu a primeira edição do jornal, em plena corrida eleitoral, estávamos sofrendo certa crise de identidade perante a classe política local. Para a desconfiada oposição, capitaneada pelo PTB e PPB, éramos sem dúvida um jornal chapa-branca. Já a situação não digeriu muito bem o fato de termos destacado na capa o vice-candidato dos opositores (não tínhamos uma foto do vice do PMDB. Por outro lado, sobrava espaço e não sabíamos como fechar a capa), nem o fato de termos coberto o lançamento da campanha e observado o evidente clima de racha que havia, fruto de uma convenção um tanto traumática para o partido, constatação que dividimos com os leitores.

Para a situação, estava claro: éramos colas-brancas.

Seu Arão

Seu Arão e Carlinhos improvisando um som: “Eu já fiz quatro gols!”

Nestes tempos de jogadores de futebol mimados e técnicos sem pulso firme, vale se mirar no exemplo do seu Arão, o técnico que mais vezes comandou o Cervejas em seus quase vinte anos de existência.

Admirador do delegado linha-dura Antônio Lopes, meu pai não dava moleza: esbravejava com o time o jogo inteiro e infernizava os juízes. Porém, profissional que era, depois do jogo pedia desculpas aos apitadores e dava risadas com a gente.

Nas “resenhas” antes das partidas, meu pai sabia como ninguém simplificar a estratégia e motivar a rapaziada:

– Aqui não tem ninguém melhor do que ninguém, é tudo homem – costumava dizer.

Faz algum tempo que o seu Arão deixou de comandar o time, por conta de suas funções como vigia da Prefeitura, mas ainda acompanha os jogos quando pode e ainda fica doente com as vaciladas do Cervejas.

Lembro que nem mesmo o primeiro goleador que o Cervejas conheceu teve vida fácil com meu pai.

Carlinhos (o da Bodega do Porto) estava especialmente inspirado durante um jogo do terceiro campeonato que disputamos. Creio que foi na temporada de 1996. Foi no verão após terem dragado parte da praia do centro, para lá do rio que delimita o Baixio. Naqueles anos, o campeonato de futebol de areia era disputado nos domingos à tarde, não havia iluminação. Por causa da subida da maré, não terminou ali – o campo teve que ser mudado novamente para o Baixio.

Pois bem, enfrentávamos o time do Besc e o jogo estava realmente equilibrado. Não sei se num momento em que o Carlinhos perdeu uma bola, meu pai esbravejou:

– Calinho, seu m….! Não tás fazendo p… nenhuma!!!

No que o Carlinhos, em tom de desculpa, arrematou:

– Mas seu Arão, eu já fiz quatro gols!

De fato, os quatro gols do empate contra o bom time do Besc.
Num jogo seguinte, contra o Hora Certa, Carlinhos não teve o mesmo brilho. Depois de tropeçar na corda que delimitava o campo de jogo, ele caiu dentro d’água. Na saída, num impulso, tirou a camiseta encharcada. Tonho do Zeli, o juíz, não perdoou e expulsou o Carlinhos. Tomou um jogo de gancho por atitude antidesportiva.

Carlinhos continuou jogando no Cervejas mais algumas temporadas. Mas ele brilhava especialmente nos jogos comemorativos que promovíamos, os chamados Cervejas x Ressacas (o Ressacas era um combinado veterano de parceiros do Cervejas). Ao mesmo tempo, sua Bodega do Porto se tornou passagem obrigatória após cada jogo disputado. A casa sempre recebeu o time muito bem, mesmo depois da maior traição que poderíamos cometer: comemorar nosso melhor resultado em campeonatos, o vice de 2006, em outro boteco.

A-lex

No meu “aviso aos navegantes” alertei que, além de relembrar os anos do Pirão, iria dar uma geral nas gavetas e também na memória e relacionar uns assuntos sobre outras coisas que não apenas o jornal. Afinal, blogue é para isso – o sujeito escreve sobre o que lhe der na cabeça.

Uma ocasião, faz uns seis, sete anos, tive que desenvolver uma matéria para um programa de rádio, tarefa da faculdade. Liguei para o Alex e perguntei se ele não poderia me dar uma entrevista. Faria a inserção no programa falando do memorável show que a banda Uniclãs havia feito em Floripa, com participação especial do vocalista dos Titãs Paulo Miklos.

Proposta aceita, fui até a casa do Alex uma tarde para fazermos a entrevista. Cheguei lá e, após um papo para pôr as novidades em dia (a gente não conversava com frequência naqueles tempos), partimos para a gravação das perguntas. Pensei um pouco, elaborei mentalmente a questão, liguei o gravador e fiz um esforço tremendo para narrar no aparelhinho a “cabeça” da matéria, algo mais ou menos assim:

– No último final de semana, a banda Uniclãs fez um show especialíssimo com uma participação do “titã” Paulo Miklos etc., etc… Alex, o que você achou… etc., etc?

E ele:

– Bem, hã, eu… hã, mmmfffff HAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA!

Tudo bem, Alex, vamos tentar de novo. E lá ia eu narrar de novo a cabeça da matéria, tentando não tropeçar no português nem carregar no sotaque:

-… Estou aqui com o guitarrista da Uniclãs, Alex. Alex, o que você achou blá, blá, blá..?

– Claro, hã, eu, mmmmmmffffff…HAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAH!!!

– Tá certo, mas agora vamos ver se sai…

– HAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA!!!

Não havia jeito. Bastava apontar o gravadorzinho para a boca do Alex que ele desatava um riso descontrolado. Gargalhava quase até às lágrimas. E eu precisava fazer duas perguntas.

Depois de muitas tentativas, um caminhão de risadas por parte do Alex, conseguimos terminar a locução. O take se perdeu entre as fitas editadas no estúdio de radiojornalismo da Univali, uma pena.

Conto esse episódio pois acho que ilustra um pouco da personalidade do Alex, sujeito de uma irreverência que desafia a seriedade de qualquer tema, brincalhão e boa praça. Isso para não falar daquilo que todo mundo em Porto Belo está careca de saber: é um guitarrista excepcional. Um canhoto com uma habilidade que chega a dar raiva nos mortais que, como eu, não conseguem enfileirar meia dúzia de dós, rés e mis com um mínimo de competência.

A primeira edição

Primeira edição do Pirão d'água: candidatos na capa e problemas à vista

Como fazer um jornal chapa-branca – I parte

Li em algum lugar que Joseph Goebbels, o ministro da propaganda de Hitler – de sinistra memória – dizia algo parecido com isto: “Uma mentira dita mil vezes se torna uma verdade”.

Não sei se acusaram a gente de ser “um jornal do PMDB” mil vezes, mas falaram o suficiente para que tivesse quem acreditasse e a gente precisasse trabalhar muito a cada edição para desfazer a falsa impressão. Claro que, em algumas ocasiões, contribuímos para que a “maldição” persistisse…

Acho que quem teve a ideia de fundar o jornal foi o André. Pelo menos, foi de sua boca que eu ouvi pela primeira vez sobre isso. Conheci o André depois que saí do Maré Mansa, um informativo bancado pelo então prefeito de Porto Belo, Sérgio Biehler. Saímos eu e o Roberto de Souza, o Piva, do Maré Mansa (saíram conosco, na verdade) e aceitamos o convite para trabalhar com o principal inimigo político do nosso antigo patrão, no caso, o Etevaldo Santana, um jornalista que tinha dois jornais, um em Bombinhas e outro em Porto Belo, e aprontava horrores – contra seu desafeto e contra a língua portuguesa também.

Lá no Maré Mansa surgiu, praticamente, um time de futebol que deu o que falar, depois batizado de Cervejas. Mas essa é outra conversa…

O André trabalhava com o Etevaldo, no escritório do piso superior da rodoviária de Porto Belo, e também fazia frila para O Atlântico, então comandado por um sujeito chamado João de Deus. Mais tarde, eu e o André decidimos trabalhar em sociedade, diagramando jornais da região. E, mais tarde ainda, incluímos o Luiz Dadam (Candôco) nessa sociedade, abrindo juntos uma empresa para dar aulas de informática. O plano parecia excelente, não houvesse aparecido uma concorrente melhor habilitada que pôs tudo a perder…

André morava em Itajaí, mas vivia mais tempo em Porto Belo, visto que tinha noivado aqui e tinha seus frilas na cidade. Guitarrista de uma banda de Itapema, depois ele teve outra ideia interessante: a de montarmos uma banda de rock. Disso nasceu a Nosferatu, mas isso também é papo para outra oportunidade…

Devia ser abril ou maio de 1996, ano de eleições municipais. André achou a ocasião perfeita. Nenhum de nós era jornalista, mas tínhamos trabalhado com jornais desde Navegantes até Governador Celso Ramos, o suficiente para acreditar saber como fazer. Mais importante: achávamos poder fazer melhor. Na verdade, queríamos entrar com tudo na campanha, promovendo entrevistas, fazendo pesquisas de opinião, enquetes com temas importantes, que pudessem nortear a corrida eleitoral. No papel, tudo certo…

Ideia aceita, havia duas decisões importantes a tomar. A primeira delas, lógico, era dar nome ao jornal. Promovemos um “brainstorm”, André, eu e o Luiz. Sentados em volta da escrivaninha do escritório que havia sido do Etevaldo, lá no piso superior da rodoviária, tratamos de lançar nomes. Mil “gazetas” disso, “folhas” daquilo e mais um monte de bobagens que usávamos para aliviar a seriedade da coisa – escolher nome de jornal não é muito fácil…

Um dos nomes que foi dito de brincadeira foi “Pirão d’água”. Quem disse? Não sei, talvez o Candôco saiba, mas desconfio que tenha sido o André. Mesmo que fosse para ser piada, o nome começou a fazer sentido quando o associamos a essa coisa de valorização da tradição local, algo que queríamos incluir na linha editorial. Parecia, portanto, senão uma boa escolha, ao menos a melhor que tínhamos no momento.

A segunda providência era conseguir um jornalista responsável. Ou seja, alguém com diploma, amigo nosso e que topasse fazer isso na camaradagem. O único com esse perfil que conhecíamos era o Vadão. Problema: ele era então secretário de Esportes da prefeitura de Porto Belo, portanto vinculado à campanha eleitoral. Ainda assim, parecia a melhor (senão, a única) opção, pois era alguém conhecido e confiável, então valia a pena tentar. Vadão topou na hora, não impôs nenhuma condição e ainda aceitou ajudar escrevendo sobre esportes, assunto que ele realmente domina e aprecia. Assim, era pôr mãos à obra e lançar na rua a novidade.

Nem imaginávamos a encrenca em que estávamos nos metendo…

Pirão d’água, o retorno

Faz uns anos, um colaborador dos tempos de Pirão d’água, o Cacau, apareceu com a ideia de fazermos circular uma edição especial desse jornal, em homenagem ao semanário que deixou de circular lá se vão dez anos. Na ocasião, Candôco e eu nos empolgamos com a possibilidade, mas o plano não saiu da prancheta – fazer jornal impresso dá trabalho e custa algum dinheiro.

Mais recentemente, amigos tinham me sugerido lançar algo nessas redes sociais, Facebook e tal, mas isso é coisa que nunca me atraiu. Por outro lado, lá na revista onde trabalho, um colega sugeriu a criação de um blogue. Pensei a respeito… Com um só livro lançado, material para a continuação deste esfriando (congelando, na verdade) na gaveta, planos para um outro título no mais completo limbo, mais uns textos antigos, sobre coisas e pessoas de Porto Belo, do meu período acadêmico que gostaria de rever, tudo isso me pareceu sugerir que largasse um pouco de preguiça e começasse a lançar na web um pouco dessa produção. Com a prática – vai saber? – poderia engrenar e tirar da fila os projetos empoeirados.

E novamente o Pirão d’água. Se não me falha a memória, foram cinco anos de uma experiência jornalística, no mínimo, interessante. Com uma dose tremenda de boa vontade e as melhores
intenções (ainda que, de boas intenções o inferno esteja cheio), muito de ingenuidade e desconhecimento de causa, conseguimos fazer do Pirão algo relevante dentro do que se pode chamar “imprensa local” (o que, talvez, não seja grande coisa – vide Gazetas de Bombinhas, Planetários e exemplares do gênero). Na pior das hipóteses, produzimos um registro do cotidiano da
península durante o período em que o jornal circulou, anotamos nas páginas que já amarelaram um pouco da sua história.

É do conhecimento dos jornalistas que o jornal de ontem serve só para embrulhar o peixe de hoje, quando muito. Resolvi, pretensiosamente, contrariar a máxima, e trazer algumas das histórias
do Pirão d’água, coisas que talvez algumas pessoas ainda curtam lembrar, especialmente nossos parceiros de empreitada. E trazer a reboque outros textos, coisas que estavam no baú, jogar conversa fora, publicar uns rabiscos, umas fotos, fazer uns ensaios – enfim, para isso que servem
blogues. Vejamos até onde isso vai dar…

Maurino Serpa

Quinta-feira, final de tarde, volto do mercado e, passando em frente à Prefeitura, vejo sentados ali na frente meu pai, seu Arão, e Maurino Serpa, ex-prefeito da cidade, funcionário da municipalidade de longuíssima data. Meu pai me saúda: “Ê, corintiano!”. Eu aproveito para cumprimentar a dupla e, num impulso, perguntar ao seu Maurino se ele não gostaria de me ajudar contando algumas histórias de Porto Belo. O amigo Ari disse-me certa vez que seu Maurino mantém diários e registra criteriosamente informações variadas. Mas ele titubeia, diz que já o procuraram com essa proposta, porém teme cometer indiscrições no campo da política. “Na emoção, posso queimar alguém”, explica. Não desisto, entretanto, e pergunto se posso visitá-lo hora dessas para conversarmos. Ele informa que, qualquer coisa, mandará recado pelo meu pai. Antes de sair, entretanto, meu pai e ele caem em reminiscências: “Tu lembra do primeiro automóvel que apareceu em Porto Belo?” “Ah, foi do seu Neném”, responde seu Arão. “Não, o primeiro nativo a ter um carro. Um carro preto, um Ford 1951, foi o Jorge Romão. O filho dele, Ricardo, vinha dirigindo”. Seu Maurino tinha uns dezesseis anos, acha que foi em 1956… E outras histórias: meu pai lembrou da vez que Cisto entrou na Câmara de Vereadores com um rifle para matar seu Neném, prefeito na época. Divertiram-se com as histórias. E eu, bem, pensei: “Tenho que entrevistar o Maurino”. Meu pai também, por que não?

“Escreve um livro pra mim?”

Ainda nesse tema das motivações. Sexta à tarde, chegando do trabalho, abraçado a três ou quatro livros, dei uma passada no banco para ver se continuava tudo no azul. Ao lado da agência, atravessando a rua, no boteco do Carlão, o Helinho e o Lipa estão sentados numa mesa, do lado de fora do bar. Há mais alguém ali, que não conheço. Sobre a mesa, alguns copos plásticos e uma garrafa dois litros de Fanta (?). A turma me cumprimenta e eu respondo, meio apressado, antes de entrar na agência. Na saída, vejo que o Lipa já está pegando a bicicleta para ir embora, ele talvez mais magro que a própria “magrela”. Aí o Hélio me sai com esta: “Dil, escreve um livro pra mim?” Pego de surpresa, faço eco da pergunta: “Um livro?”. Ele confirma. Confuso (talvez ele estivesse me confundindo com o Maninho, nosso prolífico – nos dois sentidos – poeta local), respondi que sim, faria. E tudo conspirou para que este blogue nascesse. Poderia agora responder melhor ao Helinho: “Xá comigo!”

Me dê motivo…

…para escrever num blogue. Bem, depois que acendeu a luzinha, veio o fim de semana, e conversávamos lá na casa do meu irmão, o Arão. Estavam ainda ainda o Ari, Candôco, respectivas esposas de todo mundo. Então o Arão falou de uma conversa com um morador daqui de Porto Belo (esqueci o nome), que morou na ilha João da Cunha um tempo e tinha histórias de sobra para contar. Sobre a cidade. Arão disse que comentou a respeito do livro que eu havia escrito, sobre Bombinhas, com a Janaína Venturelli, jornalista, que comentou: “É preciso gravar isso” (as histórias do sujeito). No meu caso, pensei, é preciso escrever. E o antigo projeto de um livro sobre PB voltou a exigir atenção. Este blogue serve pra isso, penso, instigar a escrever e, quem sabe, desengavetar o projeto.

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